Viajar e trabalhar pela internet ao mesmo tempo: a rotina de um nômade digital


Talvez você já tenha ouvido falar que é possível viajar pelo mundo enquanto trabalha, ganhando dinheiro pela internet.

Se fizer uma pesquisa rápida no Google, você vai descobrir várias alternativas para ganhar dinheiro de forma totalmente virtual. Os trabalhos online mais comuns são os negócios virtuais - lojas virtuais, venda de cursos em vídeo, coachings, plataformas ou softwares pagos, blogs, canais do Youtube e etc - e os freelances - projetos que estão disponíveis para as mais diversas áreas, como tradução, programação, publicidade, designer gráfico e, pasme, até advocacia e medicina.

Caso esse assunto seja uma novidade para você, recomendo ler os textos que escrevi contando como me tornei nômade digital e se vale a pena ser freelancer para poder viajar trabalhando online.

Digamos que você tenha descoberto uma forma de trabalho virtual que seja plausível para você. E que, após conquistar essa flexibilidade, queira viajar. A princípio, parece um sonho, mas pense comigo: será que esse novo estilo de vida vai ser só oba oba? Será que isso é para mim?

Eu trabalho somente pela internet desde abril de 2014 como freelancer e já tive vários altos e baixos. Considero que viver dessa forma é um ótimo negócio, tanto é que continuo trabalhando assim e não pretendo voltar ao escritório tão cedo - se é que voltarei um dia. Porém, algo que me incomoda é ver muito conteúdo sobre nomadismo digital focando apenas na parte boa e pouco explicando o outro lado da moeda. Isso pode provocar ilusão e frustração para quem planeja entrar no mundo do emprego 100% virtual.

Creio que essa falta de esclarecimento também cause a falsa impressão de que ter um emprego online é sinônimo de vida fácil. Quando conto que posso trabalhar de casa ou de qualquer lugar do mundo e que viajo bastante justamente por ter essa possibilidade, percebo comentários ou olhares me julgando, como se eu fosse uma pessoa aventureira (mas não de uma forma saudável), privilegiada ou sei lá o que mais passa na cabeça dessas pessoas.

Para que tudo fique mais claro, vou contar brevemente como é a vida de um nômade digital e, depois, como são as viagens acompanhadas de trabalho.
Viajar e trabalhar
Aproveitando para colocar as coisas em ordem na viagem de trem entre Buenos Aires e Rosário


Como é a vida de um nômade digital

Ninguém arranja trabalho na internet em um dia e começa a viajar no outro. Normalmente, requer um tempo para se consolidar no mundo virtual, juntar uma grana, se planejar e, aí sim, botar o pé na estrada. Assim, é comum ficar pelo menos mais uns meses na sua atual moradia até estar pronto para partir.

Mesmo depois dessa primeira conquista, um nômade digital não precisa viver viajando a todo momento. Ele pode resolver ficar meses ou anos em um só lugar, ou até morar para sempre na sua cidade natal se estiver feliz lá. Por isso, acho importante explicar como é trabalhar somente pela internet sem estar viajando.

Adaptação da rotina

Para quem mora sozinho ou com um cônjuge, é mais fácil transformar a casa em escritório. Mas no meu caso, não foi assim. Quando resolvi que iria ganhar a vida apenas através da internet, ainda morava com a minha mãe, irmãs e um sobrinho pequeno. Minha família custou a entender que eu tinha um trabalho sério. Por incrível que pareça, o sobrinho foi o primeiro a começar a respeitar minhas horas de trabalho. Era difícil não ser interrompida ou convencer as pessoas de que eu não estava disponível o tempo todo. Além disso, perdi as contas de quantas vezes me falaram sobre empregos "de verdade" com vagas em aberto. Com muita paciência e persistência, consegui conquistar o meu "espaço de trabalho" em casa.

Passada essa primeira fase, fui adaptando meus hábitos cotidianos.

Como passo bastante tempo em casa, acabo sentindo falta de ir à rua e ver pessoas. Preencho essa necessidade com caminhadas, aulas de ioga, saídas com os amigos e idas ao supermercado - posso cozinhar mais e gosto disso, porque tenho mais opções e ainda economizo.
Relaxando no Parque Independência, em Rosário, Argentina


Carga horária de trabalho

A flexibilidade de horário é uma característica marcante para os freelancers. Alguns trabalham 40 horas semanais, seja das 8h às 18h ou em horários diferentes. Por outro lado, há os que trabalham mais ou menos horas. Tudo depende dos seus objetivos e dos projetos que resolvem participar.

Eu escolhi trabalhar menos para ter mais tempo para fazer o que gosto. Nos últimos 3 meses, trabalhei em média apenas 8 horas semanais em projetos remunerados e muitas outras em projetos pessoais não remunerados como o Mundo de Viajante :) Lembrando que aquelas 8 horas são uma média, então houve semanas com 2 e outras com 13 horas de trabalho.

Para poder trabalhar tão pouco, busco projetos que pagam relativamente bem - uns 20 dólares por hora - e levo um estilo de vida bem econômico, sempre gastando menos do que recebo.


De novo, lembro que essa é a minha realidade! Há freelancers que recebem entre $3 e mais de $100 dólares por hora, e que trabalham entre 0 e mais de 70 horas semanais, cada um com sua capacidade e no seu ritmo.

Quer você resolva trabalhar muito ou pouco, o ideal é ter projetos com diferentes clientes, para não correr o risco de ficar desempregado de uma semana pra outra - e não vai ter seguro desemprego!

O principal projeto em que trabalho me traz uma rotina oposta à da maioria das pessoas: trabalho aos finais de semana e folgo durante a semana. Isso complica um pouco os momentos sociais com família e amigos, mas até que dá para conciliar bem.

Algo que costuma acontecer com frequência é o surgimento de trabalhos inesperados. Às vezes eles vêm da mesma empresa para a qual já estou trabalhando, outras vezes de clientes antigos ou de clientes novos. Sempre é possível recusar esses trabalhos de última hora, mas como eles trazem um dinheirinho extra, geralmente acabo aceitando. O problema é quando isso acontece justo em um dia que você tinha outros planos, então é preciso ter um certo jogo de cintura ou reduzir umas horas de sono.

O lado bom é que na maioria das vezes meus prazos são folgados e, se desejar, posso fazer várias e longas pausas durante meus afazeres profissionais.

Vantagens de não ter que frequentar um escritório

Embora eu ainda tenha obrigações de funcionária a cumprir, não vou negar que é bem cômodo trabalhar de casa. Economizo com roupa, alimentação, transporte, não perco tempo com deslocamento e me estresso imensamente menos.

Porém, para mim, o grande lance de ser um nômade digital é fazer jus ao termo "nômade", ou seja: como você só precisa da internet para trabalhar, pode fazer o serviço todo de qualquer lugar do mundo. Isso significa que é possível trabalhar diretamente da cidade em que deseja passar seu tempo de folga. E, consequentemente, seus momentos fora do expediente podem ser muito mais bem aproveitados.
Passeio pelo rio em Yangshuo, interior da China. Foi lá no outro lado do mundo que essa minha vida nômade começou!

Como é trabalhar e viajar ao mesmo tempo

É um misto entre ser turista e morador local.

Para aproveitar bem os lugares por onde passam e economizar com transporte, os nômades digitais precisam de estadias maiores do que os turistas que viajam somente a passeio. Estimo que umas duas semanas em cada lugar seriam um tempo mínimo ideal. Devido à demanda de trabalho, vão ter dias em que o nômade não vai poder sair para turistar, ele vai ficar olhando tudo o que quer explorar pela janela da sua hospedagem até terminar seu trabalho - e como isso dói!

Hoje, por exemplo, estou escrevendo esse post de Mendoza, na Argentina. Cheguei há menos de uma semana na cidade e estou louca para fazer vários passeios. Como comentei antes, minha carga horária de trabalho é mais focada nos finais de semana, então planejei uns passeios feliz e contente para fazer durante a semana. Eis que dois clientes resolvem me passar bastante trabalho e tive que cancelar os passeios! Por um lado foi bom porque estou precisando da grana, mas por outro foi meio frustrante. E o que eu fiz? Aceitei os trabalhos, fiquei bem ocupada durante a semana inteira e estendi minha estadia por mais 7 dias, para poder curtir a cidade.

Quanto do tempo vai para o trabalho, as viagens e outras atividades

Fora os trabalhos extra, normalmente meu tempo durante as viagens fica dividido assim: bastante trabalho de sábado até o início da tarde de segunda-feira e no resto do tempo eu cozinho, lavo roupa, compro o que é preciso para a casa, estudo, falo com a família e os amigos pela internet, cuido da minha saúde, de outros projetos pessoais e, claro, planejo e realizo meus roteiros de viagem. O bom é que o Pedro, meu marido, também é freelancer e viajamos juntos. Então um entende quando o outro não pode sair de casa e nos revezamos nas tarefas domésticas e de viagem.

Algumas vezes, resolvemos passar o dia em casa apenas para descansar e relaxar, isso é normal pois nem sempre estamos dispostos a bater perna. Resumidamente, é uma rotina de trabalho + afazeres de uma "vida normal" + viagem.

É uma delícia fazer aquela parte dos afazeres de uma vida normal que comentei estando em outra cidade ou outro país, porque me sinto mais daquele lugar, quase como se fosse uma moradora local. Algo que me facilita ter essa experiência é ficar hospedada através do AirBnb*.

*O AirBnb é um site onde pessoas como eu e você colocam suas casas ou apenas um quarto para alugar, pode ser para poucos dias ou até por meses. Tudo é feito sem intermédio de imobiliárias! É mais barato que hotel e tem mais conforto que um hostel, com o bônus de ter outros cômodos como cozinha e sala de estar, por exemplo. Além do mais, a pessoa que aluga geralmente dá várias dicas sobre a cidade. Considero um ótimo custo benefício e tenho usado bastante durante as minhas viagens. Se você fizer uma reserva através deste link, nós dois ganhamos R$70 em crédito no AirBnb ;)

Ano passado, quando viajei para San Andrés, estava com outros projetos mais flexíveis. Assim, aproveitava bastante a cidade durante o dia e cumpria com minhas obrigações a partir das 21h. Além de ter tido a inesquecível oportunidade de nadar com arraias, ainda pude segurar uma delas! Olha o vídeo que tenho desse momento:



Como lidar com a falta de internet em viagens

Algo um pouco complicado nessa vida de nômade é que ficamos totalmente reféns da internet - claro, ela e o notebook são as grandes fontes de renda.

O problema é que em muitos países a internet é bem precária. Alguns nômades digitais afirmam que utilizam a wifi de cafés, mas eu não acho uma boa ideia. Não consigo me concentrar com muita gente ao redor e creio que em vários cafés a internet não deva ser muito confiável. Além do mais, não curto ter que ficar consumindo no local em troca da internet.

Uma alternativa é comprar um bom plano de dados móveis, o que pode sair caro. Por isso, prefiro ficar somente em hospedagens que ofereçam internet de qualidade. Antes de fazer a reserva, já aviso que vou precisar da internet para trabalhar e pergunto se é estável, qual é a velocidade e se o modem fica no próprio local ou se o sinal vem do vizinho (sim, isso já aconteceu comigo). Antes de eu ser específica a esse ponto, tive uma experiência ruim em Providência, na Colômbia. Fiquei em uma pousada que supostamente teria internet, mas só depois que cheguei a dona falou que a ilha inteira estava sem internet há não sei quantos dias. Por conta disso, deixei de ganhar bastante dinheiro. Sorte que naquela época meu projeto era bem flexível e eu não tinha nenhum prazo para cumprir.

Quando quero viajar para algum lugar onde sei que posso ter problemas com a internet, faço um planejamento prévio: fico poucos dias nesses locais, tento programar a viagem para os dias que tenho menos trabalho e converso com os chefes para jogar o que for possível para antes ou depois da viagem.
Vista do meu quarto na pousada em Providência... digamos que a falta de internet foi compensada!

Espero que agora os altos e baixos de ser um nômade digital tenham ficado mais claros. Como sempre, se ficou alguma dúvida, é só perguntar nos comentários. E se você lembrou de algum amigo que gostaria de levar esse estilo de vida nômade, dá aquela forcinha pra mim e pra ele compartilhando esse texto :)

Um abração e boas viagens para nós!


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Sobre Mayumi Tsuruyama

Me formei em Administração por adorar o universo empresarial. Mas também sou freelancer e blogueira, por amor ao mundo e à liberdade. Encaro todas as viagens que já fiz e ainda farei como trajetos de uma viagem maior, que é a vida. Seja como turista, estudante, trabalhadora ou mochileira, viajar me completa. E eu ainda tô longe dos 100%!
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10 comentários:

  1. Mayumi, parabéns pelo artigo. Fantástico.
    Excelente dica para começar a pensar em mudar de vida, tirar proveito da liberdade. E viver, simplesmente.
    Grande abraço!

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    1. Nossa, Janete, você resumiu em duas frases o que eu penso sobre esse estilo de vida: "tirar proveito da liberdade. E viver, simplesmente". É exatamente isso!
      Muito obrigada pelo seu comentário, querida. Espero de coração que tenha ajudado a inspirar você e outras pessoas que venham a ler.
      Fiquei feliz em ver você de novo por aqui ;) Outro abraço!

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  2. Me identifico muito com o estilo de vida de um nômade digital, tenho estudado muito sobre o assunto e penso que um dia posso tentar viver assim.Por enquanto estou praticando através de um blog que acabei de criar a partir da minha primeira experiência em viagem internacional : soltanomundoblog.wordpress.com Esse post me deu muita inspiração!Obrigada ��

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    1. Oi, Samara! Que ótimo saber que te inspirei :D É isso mesmo, o importante é botar a mão na massa logo e ver o que se encaixa melhor pra você. Se tiver alguma dúvida sobre esse assunto, pode ficar à vontade pra perguntar. Vou passar no seu blog também! Um beijo!

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  3. Me identifico muito com o estilo de vida de um nômade digital, tenho estudado muito sobre o assunto e penso que um dia posso tentar viver assim.Por enquanto estou praticando através de um blog que acabei de criar a partir da minha primeira experiência em viagem internacional : soltanomundoblog.wordpress.com Esse post me deu muita inspiração!Obrigada ��

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  4. Olá tudo bem?
    Existe algum problema para imigração do país que exige o visto de turismo saber que vc está entrando no país a passeio e ao mesmo tempo trabalhando?
    Obrigada

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    1. Tudo bem, Patrícia, e com você?

      Ótima pergunta hehe! Eu já andei pesquisando sobre isso faz um tempo e ainda não encontrei uma resposta satisfatória. Imagino que esse não é um assunto muito abordado (oficialmente, pelo menos) porque muitos países ainda não regulamentaram a questão dos freelas realizados unicamente pela internet. Por isso, parto do princípio de que "se não está escrito que não pode, então pode". Eu viajo trabalhando online, mas quando passo na fronteira digo apenas que estou indo a turismo - o que não deixa de ser verdade, porque também sou turista e não vou exercer nenhuma atividade remunerada vinculada a algum lugar físico - e sempre respeito a estadia máxima do meu visto de turista.

      Na verdade, nunca tive nenhum problema com isso porque em nenhuma imigração que passei fui questionada quanto às minhas fontes de renda. Imagino isso como um potencial problema para estadias longas, tipo mais de 3 meses, o que ainda não fiz. Aí é muito importante ver se o país em questão tem alguma política em relação a trabalho online e comprovação de renda.

      Sei que ficou um pouco confuso, porque também não tenho a resposta exata para a sua pergunta, mas espero ter ajudado pelo menos um pouquinho :)

      Um abraço!

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    2. Opa ajudou sim. Acredito que seja um problema tb ja que ainda não exista uma lei.
      Obrigada pela ajuda.

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    3. * Acredito que não seja uma problemá hehe

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    4. Esperamos que seja assim né :D

      Acho que depende muito do país também. Alguns são bem abertos aos turistas porque sabem que vamos ajudar a movimentar a economia lá. Outros já são mais fechados e recusam a entrada de várias pessoas, mesmo que estejam com os docs todos certinhos. Infelizmente, é um risco que sempre corremos fora do nosso Brasil.

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